quinta-feira, 25 de setembro de 2008
Confissão
Não me importa quem você é, o que me importa sou eu. O que importa é que você aprecia o que sou e o que eu produzo, massageando meu ego.
Não me importo com a dor alheia, com a sua dor, desde que essa dor não seja em mim. E mesmo para minha dor eu não ligo, pois a dor é também faceta da vida. Vivo o presente, estou fadada aqui viver até morrer. Não me preocupo com a morte, com os que partiram, nem com nada disso. Não estou preocupada com sua opinião, pois ela não interfere em quem sou. Não sou o que você deseja, não estou interessada em agradar você. Pense o que quiser.
Meu egoísmo faz com que eu gire em torno de mim, fica por perto quem me entreter. Gosto de brincar com a vida, com as pessoas, com o mundo, se isso faz mal a alguém não ligo. Não volto atrás, não tenho arrependimento por isso.
Odeio os idiotas, os falsos, os burros, hipócritas, os fracos, os indecisos, os débeis, os sem juízo, os que não têm razão e ignoram os "porquês", odeio os estúpidos, odeio os medíocres, os bostas, os básicos, os mesquinhos, os falaciosos, pretensiosos, que falam e nada são. Odeio os que são coca-cola. Odeio gente feia, odeio gente porca, gente preguiçosa, gente subserviente. Odeio gente incopetente. Odeio quem vive doente, chora miséria, e vive de compaixão. São os sentimentos dos fracos, perdedores, os nerds. Os que não são ninguém, podem ter o mundo, nunca alguém serão. Vivem nos guetos, nas sombras, nas trevas, vivem nos subúrbios, nos sótãos, cavernas, vivem nos lixos, no breu, não têm chão. Vivem da fome, se alimentam da miséria, não material, não têm alma, não têm bem espiritual. Choram sem lágrimas, reclamam de tudo, pode nunca chover mas nunca enxergam o sol. Nada em suas vidas brilha, sempre na escuridão. Odeio os fracos, os pobres de alma, que não se conhecem, não se possuem. São alienados, não têm paz e nem fazem guerra, vivem apáticos, se rastejam ao chão. Não tenho paciência com esse tipo de gente, se amanhã eu morresse diria até mais. Não sou cruel, sou realista, um ser humano forte, feito no amor, para a guerra e para a paz.
Prefiro não saber quem eu sou
Prefiro me exergar menina
Quando a vida grande mulher me formou
Prefiro não falar em prosa
Na poesia posso me anuviar
Não quero por ti ser vista
Quem sabe te permita aí passar
Não quero está presa aqui
Não quero nada além de mim
Sequer quero um lar
Quero a liberdade da rua, quero a liberdade sem par
Mas isso não é coisa de menina
Menina de verdade o que quer é casar
Marido, filhinhos, brincar na cozinha
Ser moça de família, doméstica cuidar
Sei mais não ser menininha
Também sei não se vou me casar
Temo que homem algum nesse mundo
Minha enorme grandeza possa suportar
Sou mulher sou forte sou rainha
Nem Cleópatra, Afrodite ou Agar
Sou mulher, mulher completa, mulher divina
Sou mulher que vive do prazer e para amar
Mulher como eu, não sei quantas existem na vida
Às vezes me sinto sozinha no mundo a vagar
Não sou homem, não sou mulher como todas
Temo o que sou, sou muita mulher mais do que possa suportar
Mulher livre, grande e cheia de vida
Temo a mulher que dentro algumas vezes
Ao meu ouvido está a gritar
Ela quer sair e viver no mundo, dele desfrutar
Cresço. Chegará o momento que ela sairá
Não serei eu, e não será apenas ela
Seremos duas numa só a existir
Não sou como quero, nem como gostaria
Cansei de lutar, de simular, fingir
Venha o que vier
Seja o que tiver de ser
Sou mulher, fui menina, não sou homem e sou forte
Preciso me aceitar desse mesmo jeito, assim
Não tenho lei, não tenho limites ou regras a seguir
Sigo minha vontade e meu bem querer
Nada no mundo me pode impedir
Amo o que sou, amo o meu ser
Seja forte meu bem se quiser ficar por aqui
Sou um furacão, sou muito forte
Seja mais forte e me terás inteira para ti
Não pisque, não peque, não há perdão,
Apenas vingança, isso sim
Olhe nos meus olhos e diga a verdade
Não mintas, te arrependerás se mentir
Amo com a alma, a vida e força que abrigo em mim
Amor se transforma em ódio, nunca se esqueça
Vingança de mulher é traiçoeira, se vinga olhando, mata amando
E de seu veneno não terá como escapolir
domingo, 21 de setembro de 2008
Amizade Virtual
Nunca haverá uma tarde como esta novamente
E não quero vivenciá-la na solidão do meu ser
Não, não quero
Preciso de você aqui nesse espaço virtual
Presente e ausente
Através da Conexão banda larga
O que seria de mim, oh amigo meu, se não fosse a internet
Para encurtar o espaço que nos separa
Que nos distancia
Não me deixe, imploro-te irmão meu
Não te afaste de mim
Não me responda com teu silêncio incognoscível
Fique aqui
Através deste duro teclado posso contigo me comunicar
Embora o mouse não funcione muito bem, conheço teclas de atalho
Para essa linda e sincera mensagem enviar
Não te afaste, nem por um minuto
Nem enquanto vais ao corredor fofocar da vida alheia
Não, não vá embora
Já chega as duras horas que nos separam
O fim de sexta-feira é um suplício, não terei teus e-mails a ler
Durante todo o final de semana...
Então continue on line comigo
A não ser que seu chefe esteja por perto, não me deixe só
Não, não me deixe
Nem para o intervalo do café...
Ass. Amiga virtual seg à sex das 8 às 17h
Equívoco
Carta
Um dia Lara resolveu escrever uma carta para um rapaz de quem ela gostava. Ela se percebia complicada, mas ele era capaz de compreendê-la, então não exitou e escreveu para ele a carta sob o título "As mulheres que moram em mim..." para com ele compartilhar das contradições que abrigava em si. Essa carta nunca foi entregue pois Lara não chegou ao lugar combinado para entregar pessoalmente a carta ao tal rapaz. Nada se sabe dele. Lara sumiu. A carta foi encontrada num banco de estação ferroviária junto a um lenço úmido supostamente por lágrimas da jovem. A pessoa que encontrou a carta, a devolveu no endereço de remetente. A família de Lara passou anos a procurá-la sem sucesso. Posteriormente, diversas explicações foram criadas para seu sumiço. Lara teria fugido com seu amado para as ilhas Cayaman; ou então teria no caminho do encontro se apaixonado e fugido com um traficante de drogas de uma das favelas do Complexo da Maré; ou por fim, indo comprar cigarros - Lara não fumava - ela teria tropeçado na calçada caindo na pista, atropelada por um táxi, morrido, teria sido enterrada como indigente.
Não se sabe o real paradeiro de Lara, mas a carta revela sua personalidade complexa. Atualmente é um material acessado por cientistas das áreas humanas: psicologia, antropologia, filosofia, sexologia, teologia etc. Enfim, segue a carta transcrita:
"Ao meu amado.
As mulheres que moram em mim gostam de você... Elas gostam de modo diferente, às vezes não gostando até. Elas são muitas, são diferentes, são complicadas.
Há aquela que não gosta nem desgosta, é indiferente, e se aproveita de você, do seu corpinho masculino. Tem uma que te obedeceria de olhos vendados e tudo que você dissesse viraria dogma para ela, se não fosse a influência de outras. Uma outra adoraria dar na sua cara na hora do sexo (ela não faz amor), e não reclamaria se recebesse de volta. Te diria coisas obcenas ao ouvido, e tais coisas eu me envergonharia muito se fosse dizê-las. Ela adora quando você puxa seu cabelo...
Tem uma menina que te ama, com paixão de irmão, amigo, pureza de amor de filha a um pai. Essa é a que você já viu chorar. Ela não entende coisas do mundo e das "gentes grandes", por isso vira e mexe sofre. A maior parte do tempo ela irradia alegria pura e sincera.Tem aquela mais séria, rígida e centrada. Ela vive segundo a razão, entende tudo pelo prisma lógico e sabe resolver equações matemáticas. É sarcástica, por vezes irônica. Extremamente realista, tange o pessimismo, mas a verdade é que é cética. Sabe separar razão da emoção, mas não consegue praticar... Tem uma romântica-platônica que cria contos de fadas e quer vivenciá-los. Esta atrapalha aquela lá. Escreve coisas com coração em volta, faz birra e pirraça, não suporta ouvir não. Ama exessivamente, se doa, faz drama, chora, grita... bleh... É a mais temperamental. Quase atriz de drama mexicano, pieguisse é elogio para seu comportamento visceral... Tem aquela que não diz nada, não expressa nada, e a tudo observa. Observa a si, e suas facetas; e observa você, quem você é. E sem dizer uma palavra permanece ao seu lado mesmo quando não está por perto.
Uma dessas aí sabe que amores vêm, amores vão. E se algo tem fim é por que teve um início, e não é por isso que o mundo acaba. Coisas terminam outras começam. A vida, segundo ela, é como um grande barco, há portos em que precisam desembarcar pessoas para que outras possam subir.
Outra não quer pensar com seriedade no que a preocupa, então simula, nada está acontecendo. Prefere não dar a importância que acredita que o assunto merece.
Uma outra chora copiosamente por dentro, embora poucas lágrimas tenham rolado de sua face, sua garganta está com nó do choro não chorado.
Ainda outra deixará tudo para seguir a emoção. Tem aquela que nada diz, somente observa sendo expectadora de sua própria vida. E aquela que não liga para nada disso, acha perda de tempo a escrita desta carta.
E somada, tem aquela que administra todas as mulheres. Essa sou eu, e ela precisa de sua ajuda, pois já não aguenta gerir tantos epicentros juntos numa mesma região, seu próprio corpo. Ela precisa e quer você. Essas mulheres, suas mulheres, têm muitas reações díspares, antagônicas e paradoxais. Elas são assim.
Isso é pouco delas, elas são muitas e são mais. São variadíssimas. Todas elas sou eu. Somos nós. Todas têm algo diferente a dizer. São diferentes entre si. São eu. E elas precisam, todas, elas e eu, precisamos de você.
beijos,
Lara"
terça-feira, 16 de setembro de 2008
Ela foi-se embora, depois de ter contado detalhes do trágico falecimento da sogra e de ter ouvido de meus dissapores afetivo-relacionais - termo rebuscado que utilizei para dizer que... exatamente, não sei dizer o que aconteceu mas aconteceu algo que não sei dizer ou explicar, mas não é nada saboroso de vivenciar.
Então fui para o MSN e tentei me relacionar virtualmente com as pessoas no intuito de despistar a ansiedade e a inquietação. Não funcionou mas coloquei a fofoca em dia com quase uma dúzia de pessoas. Não satisfeita, decidi escrever um texto sobre o que realmente estou sentindo, e para ser franca, não estou sendo sincera em nenhuma linha do que escrevi até aqui. Isto porquê é fácil falar do século 21 e suas tecnologias, da feiura da mulher e do trânsito da cidade; mais fácil é falar da vida da amiga e do falecimento da mãe de seu namorado, assim como é fácil falar o que não entende de um modo menos cogniscível ainda; difícil é retirar todas as máscaras e cada uma delas, e olhar no espelho diante de si, e olhar pela janela cada um de vocês, e olhar para dentro de si, fazer viagem por dentro e falar daquilo que realmente tem importância. É difícil dizer que há um nó do tamanho do Universo preso na garganta e que também há grito mudo ensurdecedor riscando cada corda vocal que se tem. É difícil pensar que daqui a pouco vou publicar esse texto no meu blog e que me tornarei vulnerável para aqueles que passearem por aqui. É difícil dizer do que sente no coração, do medo de perder, da dor de perder quem se ama, e saber que não pode fazer nada para não perder. Sabe também que está perdida, e que todos estão perdidos na busca de resposta para perguntas que muitos destes sequer fizeram ainda. Sabe que se encontrar é simplesmente saber criar ou memorizar as respostas certas verbalizando-nas no momento certo, convencendo aos outros que você se encontrou. Sabe que ser seguro é apenas convencer as pessoas a sua volta que você é seguro. E aprender que não importa quem você é, mas quem você parece ser. E aprende que aprender isso não te leva a lugar algum, mas muitas pessoas acreditam que sim então você acaba dando valor a isso também para o bem de sua inserção social. Sabe que você começa a refletir sobre a vida e sobre o mundo somente como fórmula de se esquivar de sua vida e de seu mundo. E saber que por estar se expondo demasiadamente terá que somar forças mais que o normal para postar esse texto para o blog. Então vou parar por aqui pois esse texto não é poesia, não é metáfora, é uma prosa intimista, o eu-lírico sou eu, então vou sair daqui antes que seja muito tarde. Ops, já é tarde, pois fui descoberta aqui no meio destas palavras, destas letra. Fui descoberta tentando me esconder perdida no meio dessas frases. Agora não tem alternativa a não ser nunca postar esse texto. Caí em mim, dentro de mim e me encontrei perdida. Não consigo retornar ao texto, não tenho forças. Também me falta vontade de me revelar mais. Vou embora...
sábado, 13 de setembro de 2008
Subiam e desciam
Nuvens de fumaça
No branco tácito do ventre
Vertigens azuis
Suspensão do ar
Asfixia ao impostar
Corrida para o lado e para frente
Sem saber para onde ir
Não sabendo se parar
Ou seguir em frente
Talvez nem disposto a sorrir
O sol e a lua brilhavam em suas costas,
passos largos, faltavam cair
Nuvens de fumaça
Voltavam
Começava agora sua vista embaçar
Não queria aquilo não queria nada
Estava confuso
Suspendia o ar
Em cada instante
O salto pulava
A cada minuto
Havia alguém para lá
Não sabia muito
Não sabia nada
Não sabia ser
Não sabia estar
O pulo alto cada vez
Mais avançava
A cada pulo mais se via
O mar
Não queria terra
Não queria água
Prescindia de tudo
Inclusive do ar
Nuvens espessas
Sua alma inundava
Águas quentes
Gelavam sua solidão
A cada pulo
Havia algo mais que amava
Amava o mundo
Sua solidão
Não era tudo
Não era nada
Não sabia ser
Também ficar
Mas queria tudo
Não querendo nada
Queria tudo
Numa vida
única alcançar
A célula
Dividiu-se
Nasceu
Dividiu-se
Morreu
Nasceu
Morreu
Sem se dividir
Morreu
Antes de nascer
Sem se dividir
Morreu
Morreu se dividindo
Nasceu dividida
Morreu nascendo
Nasceu morta
Morreu dividida
Dividida nasceu
Morreu
Nasceu
Saudade do que sou e não sou mais aquilo que fui. Saudades do que não queria ter sido, mas fui e por isso tenho saudade. Saudade do que não queria ter deixado de ser, mas não houve escolha. Fui você ontem, sou você hoje, serei você amanhã. Eu sou. Eu fui. Eu vou.
Tenho saudade de mim, inocência minha ter saudade. Tenho saudade de mim, tranqüilidade demais. Tenho saudade, despreocupação incontida. Tenho saudades, no olhar sublime e esperançoso para o futuro, saudade do passado. Saudade.
Saudade nostálgica, infrutífera. Saudade do senso não crítico, saudade.
Saudade...
quarta-feira, 10 de setembro de 2008
A única coisa que pedi: sua presença e companhia.
Este era o meu desejo.
Sempre que procurei por ele, encontrei o não, o vazio
E visitei minha solidão.
Nisso adivinhei que o fim se aproximava.
O fim daquilo que não foi e não tinha fôlego para ser.
Não sofri, me calei. Não sorri, nem chorei.
A cabeça não ergui, mesmo abaixei.
Senti.
A vida era assim.
Não havia por que chorar, ou discutir.
Já tinha ouvido disso falarem;
Comprovava, o mundo é bem assim.
Repetidamente ouvi não, palavra a que estive acostumado,
Sonoridade peculiar.
Dor do não que vinha e não passava;
O medo do vazio e o medo de sonhar.
A frustração do não que me acovarda,
Continuamente me impede de acreditar.
E na indiferença viver
Nem fingir ser forte,
O amor não se pode tentar vencer
Não quero fingir que não importo
Ou que não sinto sua falta aqui
Quero revelar meu coração
Independente da dor que possa sentir
Quero ser feliz de vez
Com ousadia, intrepidez e determinação
Quero amar à revelia dos preconceitos
E precondições, idiotices que alguém fez
Quero olhar para o futuro, com certeza e determinação
Quero estar pra sempre ao seu lado no mundo
Contrariando estatísticas de separação
Quero andar na contramão
E para sempre te amar
Quero viver a pieguice
De querer contigo ficar
E causar espanto, inveja,
repulsa ou compaixão
Não importa o que os outros pensem
Ao seu lado serei livre
Mesmo que seja vivendo em prisão.
terça-feira, 9 de setembro de 2008
Espero que não faça bagunça e não ataque a emprega. Na verdade acredito que não atacará. Não lhe deixarei uma gota de energia. Brincaremos a noite inteira, estou muito estressada e preciso relaxar. Estou passando o tempo escrevendo, mas já preparei os brinquedos para a diversão. Tenho tudo. Encerro por enquanto, meu marido vem vindo, do jeito que mandei: Limpo, Cláudio e nu.
segunda-feira, 8 de setembro de 2008
Melhor será se afastar
Por que o corpo anseia e quer
Com o tempo isso pode aumentar
Por isso amor e desejo são sentimentos
Difíceis de controlar
Melhor que estejam separados, pois assim
Podemos-lhes amenizar
Quando o corpo inflama
Com chama que já vem do coração
A alma solta o corpo devora
Objetivo da sedução
O fogo acende o corpo aquece
A alma implode dentro de si
O corpo emana água que brota
De duas vidas unidas ali
sábado, 6 de setembro de 2008
CITAÇÃO DE LOU ANDRÉAS-SALOMÉ
Lou Andréas-Salomé, in citação de Stéphane Michaud, na sua obra biográfica Lou Andréas-Salomé, p. 204, Asa, Lisboa, 2002
Vulcões (Florbela Espanca)
Não tem a lividez sinistra da montanha
Quando a noite a inunda dum manto sem igual
De neve branca e fria onde o luar se banha.
No entanto que fogo, que lavas, a montanha
Oculta no seu seio de lividez fatal!
Tudo é quente lá dentro…e que paixão tamanha
A fria neve envolve em seu vestido ideal!
No gelo da indiferença ocultam-se as paixões
Como no gelo frio do cume da montanha
Se oculta a lava quente do seio dos vulcões…
Assim quando eu te falo alegre, friamente,
Sem um tremor de voz, mal sabes tu que estranha
Paixão palpita e ruge em mim doida e fremente!"
Florbela Espanca - Trocando olhares - 04/05/1916
Não sou dondoca
Dois homens e um amor
O que dizer deste luar
O que dizer da canção
Que impulsiona o serenar
O que dizer da minha vida
O que dizer do meu amor
O que dizer de meus sentimentos
Ávidos novamente por dor
O que dizer da minha paixão
E da minha alma que arde por viver
O que dizer do meu medo
Acordar e num certo dia te esquecer
O que dizer do que é fugaz
Daquilo que era e já deixou de ser
O que dizer sobre esse mundo
Se ainda busco me responder
O que dizer da minha procura
O que dizer se jamais encontrar
O que fazer com essa vida
Livre solta viva, plena,
Simplesmente por aqui estar
O que dizer de ti, que diante de mim se dispõe
Lanço mão, te amo e te sacio sem medo
Seguindo o compasso que a canção se nos impõe
Ilusão onírica
Vejo-o como jovem indo para sua partida de futebol
Certa vez foi um pequeno menino que abracei como uma mãe
A ilusão onírica intenta me dizer algo que não traduzi
Talvez diga que aquela paixão de outrora ainda não
está pronta para sair de mim
Há resquícios do que foi, algo que não voltará a ser
No coração há o desejo
Que o impossível pudesse acontecer
Hoje à noite o vi de perfil, ele lindo, negro, alto
minha primeira paixão
Não fitei seus olhos, medo que me descobrisse
Ainda apaixonada, sob os olhos de rejeição
Desejei que ele me procurasse
E que me falasse de seu amor
Mas dele apenas ouvi o silêncio,
Sem sua voz, a faísca da paixão
finalmente se apagou.
LOU ANDREAS -SALOMÉ: A PAIXÃO VIVA
LOU ANDREAS -SALOMÉ: A PAIXÃO VIVA(Do Livro: Os Sentidos da Paixão. Ed. Cia de Letras, 1987, págs. 359-373)Luzilá Gonçalves Ferreira
Lou Salomé: uma prática de paixão; alguém que viveu a paixão com paixão, e talvez por isso mesmo provocou, até uma idade avançada, o nascimento da paixão nos seres que encontrou em seu caminho: Rilke, Nietzsche, Paul Rée, Tausk e, ao que parece, até mesmo Wagner sucumbiram ao seu encanto e à alegria de viver que transpirava em cada um de seus gestos - e o próprio Freud não parece ter sido indiferente à graça da discípula que ele qualificou de "raio de sol'.
A paixão de Lou pela vida transparecia em seu próprio físico. Freud lhe escreveu um dia: "você tem um olhar como se fosse Natal". E a escritora Helena Klinkberg (citado por Peters): "O sol se levantava quando Lou entrava numa sala". Era um ser luminoso, transparente e lúcido, daquela lucidez talvez de que fala João Cabral de Melo Neto a respeito de Monsieur Teste: "uma lucidez que tudo via, como se à luz ou de dia". Um ser humano para quem a felicidade é condição natural e destino do homem: "dentro da felicidade eu estou em casa". E ainda: "A única perfeição é a alegria".
Essa paixão pela vida, ela a transmitia aos outros, fazendo com que as pessoas ao seu contato desenvolvessem e dessem o melhor delas próprias. O que fez alguém escrever: "Quando Lou se interessa apaixonadamente por um homem, nove meses depois este homem dá à luz um livro. Um interesse pelo outro que o leva a crescer e produzir - mesmo quando esse crescimento e essa produção implicam o sofrimento.
Pois Lou Andreas-Salomé conseguiu realizar, em seus 76 anos de vida, o que nós todos gostaríamos e deveríamos fazer sempre - e não o fazemos por descaso, indolência, medo: tornar a vida o exercício apaixonada de uma busca. Sua exploração em todos os possíveis. Isto que requer a fruição intensa e incessante de coisas e pessoas que nos cercam, de modo que o mundo exterior em nós penetre e a nós se incorpore. Pois a vida, como o dizia Rainer Maria Rilke a propósito de Rodin, "está nas pequenas coisas como nas grandes: no que é apenas visível e no que é imenso".
Antes mesmo do seu encontro com Rilke, Louise von Salomé já intuía essa verdade: desde muito cedo encontramos nela um grande apetite de aprender e de amar - e o objeto de sua atenção podia ser a psicanálise, a curtição de uma paisagem, de uma flor, de um esquilo na floresta ou de um corpo amado.
(.....) Lou escreveu vários ensaios sobre o Erotismo. O primeiro deles data de sua ligação com Rilke. Intitulado reflexões sobre o problema do amor, traz as evidentes marcas da embriaguez física e espiritual que sua autora estava vivendo. Aqui ela assinala, em páginas de um admirável lirismo, a capacidade que tem a paixão amorosa de nos abrir o caminho ao sentimento da totalidade da vida e sua faculdade de nos colocar em estado criativo. O ato amoroso "nos enche a alma inteira (...) de ilusões e de idealizações espirituais, forçando-nos o mesmo tempo a nos chocar brutalmente, sem possibilidade de se esquivar, ao dispensador de uma tal desordem; ao corpo". E Lou escreve:
"Pois, sobretudo, resulta no indivíduo uma espécie de interação ébria e exuberante das mais altas energias criadoras do seu corpo e a exaltação mais alta da alma. Enquanto nossa consciência se interessa vagamente, habitualmente, por nossa vida psíquica, como por um mundo que conhecemos mal e que controlamos ainda pior, que ao que parece forma um com ela, mas com o qual normalmente ela se entende mal - eis que se produz subitamente entre eles uma tal comunhão de enervação que todos os seus desejos, todas as suas aspirações se inflamam ao mesmo tempo."
Por essa exaltação da alma através dos sentidos, por essa impressão que o ato amoroso nos dá de haver ido muito longe, e tocado o indizível, é que ele pode influenciar e favorecer a criação, a "pátria do dizível", como escreveu Rilke. E Lou: "O Mundo da criação e do amor significa: volta ao país natal, entrada no paraíso; o a impossibilidade de criar, ou do amor morto, é, ao contrário, um exílio onde os deuses nos abandonam".
A atividade criadora se apaixona por tudo aquilo que é vida em nós, que é indício do que em nós lateja de mais secreto, e que atinge as raízes do ser. O espírito descobre forças que não possuía ou das quais não se apercebia. Pode voltar àquele estado de inocência primeira que possuiu na infância, redescobre a "novidade" das coisas, com o frescor de uma sensação primitiva: o olhar da criança sobre o mundo que descobre maravilhada; o olhar de Adão diante de Eva recém-saída de si.
Confrontado com os seus longes, o amado vê a si mesmo, e ao mundo exterior, como algo recém-criado. Por isso, às vezes a gente sai do amor como quem saiu de uma catedral, redescobrindo o mundo aqui fora com os olhos renovados. O ato amoroso, vivido em plenitude, obriga os amantes a concentrar em si mesmos tudo aquilo de que são capazes, passível de germinar com a força das plantas na primavera.
"Nesta igualdade original do corpo e do espírito e nesta consciência ingênua de um e de outro - uma criança que acredita em tudo que vê, para quem tudo se renovou, que, cheio de uma fé e de uma confiança sem limites, gostaria de gritar sua alegria ao esplendor inverossímil do mundo, e não saberia saudar de melhor modo a razão senão fazendo cabriolas diante dela... como se balbuciasse em sonho, ele tem algo a dizer sobre estes esplendores ocultos que lhe fizera, ai de nós, esquecer tantas coisas úteis e necessárias."
O ato amoroso transforma o parceiro num "conto estranho e maravilhoso". A Paixão amorosa é uma porta, diferente de todas as outras portas, "em sua arquitetura ornada de elementos ricos de sentido, em virtude de um simbolismo singular". É o caminho por excelência que nos leva a nós mesmos. Por ela "nós não somos um mundo de realidade, somos apenas o espaço e o metteur en scène de um mundo onírico, todo-poderoso, irresistível".
Assim, o amor durará enquanto os amantes forem capazes de oferecer ao outro essa entrega, que dá acesso de modo vital à capacidade de se concentrar neles mesmos, de ser um mundo para si por causa do outro.
A esta altura, a gente poderia se perguntar - não seria esta uma visão demasiado idealizada do amor? Mas Lou não se deixa embalar incondicionalmente pelo êxtase da paixão: esta grande amorosa foi também, segundo a expressão de Freud, uma "compreendedora".
Neste mesmo ensaio, ela nos lembra que no êxtase amoroso, por mais que desejemos nossa fusão com o amado, sempre somos, em última análise, remetidos a nós mesmos. A reconciliação que se fará aqui será sobretudo entre o sujeito e ele próprio, através do outro, mais do que entre o sujeito e o objeto amado.
Num ensaio sobre o erotismo, datado de 1910, e num ensaio posterior, quando Lou já se engajara definitivamente à psicanálise, intitulado Anal e Sexual, ela nos lembra que na união física "a gente não possui um ao outro por meio do corpo, mas apesar do corpo, que, como todo mundo sabe, não se identifica jamais (...) completamente com o todo da pessoa, mas aparece sempre como uma parte dela e resiste à dominação mais viva".
(....) A fusão inteira do nosso ser com o outro, por mais querido que seja, não seria desejável. É preciso que sejamos cada vez mais nós mesmos, para poder ser um mundo para o outro. A relação erótica, remetendo-nos a nós próprios, é uma ocasião de constante renovação: cada vez ela inaugura em nós um ser novo; como um ato de linguagem, cada vez que eu falo a um Tu, é um Eu diferente que fala a um novo Tu: quando digo Eu, já não sou aquela que falava há pouco. A relação erótica é, assim, nela mesma, criação. E o amor um elemento de produção: somos a cada instante outros, encontramos no outro cada vez um elemento novo, diferente, desconhecido, misterioso até - o que dá à relação erótica sua riqueza:
"só aquele que permanece inteiramente ele próprio pode, com o tempo, permanecer objeto do amor, porque só ele é capaz de simbolizar para o outro a vida, ser sentido como tal. Assim, nada há de mais inepto em amor do que se adaptar um ao outro, de se polir um contra o outro, e todo esse sistema interminável de concessões mútuas... e, quanto mais os seres chegam ao extremo do refinamento, tanto mais é funesto de se enxertar um sobre o outro, em nome do amor, de se transformar um em parasita do outro, quando cada um deles deve se enraizar robustamente em um solo particular, a fim de se tornar todo um mundo para o outro."
É preciso que a gente seja sempre, um para o outro, duas deliciosas surpresas fecundas. Aquele mundo da fábula de La Fontaine "Os dois pombos", que aconselha aos amantes: "Amantes, felizes amantes, vocês querem viajar? Que seja pelas margens próximas/Sejam um para o outro um mundo sempre belo, sempre diverso, sempre novo./ Sejam um todo um para o outro, contem por nada o resto".
E Lou analisa esta necessidade de renovação e da existência do mistério na relação amorosa:
"Pois, nos seio mesmo da paixão, nunca se deve tratar de "conhecer perfeitamente o outro": por mais que progridam neste conhecimento, a paixão restabelece constantemente entre os dois este contato fecundo que não pode se comparar a nenhuma relação de simpatia e os coloca de novo em sua relação original: a violência do espanto que cada um deles produz sobre o outro e que põe limites a toda tentativa de apreender objetivamente este parceiro. É terrível de dizer, mas , no fundo, o amante não está querendo saber "quem é" em realidade seu parceiro. Estouvado em seu egoísmo, ele se contenta de saber que o outro lhe faz um bem incompreensível... os amantes permanecem um para o outro, em última análise, um mistério."
Assim, o amor não seria um encontro, mas uma busca. Não quer dizer que chegamos, mas que estamos próximos.
Rilke perguntava-se na Primeira elegia de Duíno: "Não é tempo daqueles que amam libertar-se do objeto amado e superá-los, frementes? Assim a flecha ultrapassa a corda, para ser no vôo mais do que ela mesma". E nas cartas a um jovem poeta, em maio de 1904:
"Assim, para quem ama, o amor, por muito tempo e pela vida afora, é solidão, isolamento, cada vez mais intenso e profundo. O amor, antes de tudo, não é o que se chama entregar-se, confundir-se, unir-se a outra pessoa. (...) O amor é uma ocasião sublime para o indivíduo amadurecer, tornar-se algo por si mesmo, tornar-se um mundo para si, por causa de um outro ser: é uma grande e ilimitada exigência que se lhe faz, uma escolha e um chamado para longe."
Se o amor é uma busca, se o estudo é uma busca, a arte uma busca, a vida inteira é também busca. E o amor e a paixão são a mola dessa busca.
É preciso buscar com amor, com paixão. Amar a vida, amá-la mesmo e sobretudo quando ela chega ao fim, e o espírito e o corpo vêem limitados seu campo de ação. Nos Cadernos íntimos dos últimos anos, Lou Andreas-Salomé dá um balanço de sua vida. Em fevereiro de 1934, isto é, três anos antes de morrer, ela escreve:
"Distingue-se entre os humanos aqueles que se sentem divididos em um passado e um futuro e aqueles que vivem o presente com cada vez mais densidade, sempre mais plenitude. Os orientais acham natural insistir menos sobre a morte do que se passa do que sobre a perfeição do que se acaba, como aprofundamento da realidade. Nós, ao contrário, começamos a ver aquilo que nos chega, apenas sob o aspecto sempre mais sinistro da morte - como tudo o que se observa de um olhar exterior, logo mortífero."
E um pouco mais adiante:
"Sempre não tive a idéia fixa de que a velhice me traria muito? Em meus jovens anos escrevi em algum lugar: primeiro nós vivemos nossa juventude, em seguida nossa juventude vive em nós. Não sei bem, ainda hoje, o que eu queria dizer com isso outrora. Mas eu tinha realmente medo de não atingir a idade de viver esta experiência; eu o sabia profundamente, uma longa vida, com todas as suas dores, vale ser vivida,. Claro, o valor da vida pode nos ficar escondido pelos desgastes sofridos pela nossa carne, nosso espírito (...) do mesmo modo que a juventude mais empreendedora pode se ver entravada em sua felicidade e em seu sucesso, por um fatal concurso de circunstâncias; mas, por além das perdas, a velhice adquire muito mais que a famosa aptidão à serenidade e à lucidez: ela permite que se chegue a uma plenitude mais acabada."
A velhice pode ser, assim, uma volta àquela espécie de paz inicial e retorno do indivíduo a um estado de não-divisão, de fusão primitiva do eu para consigo mesmo, o corpo parece se acalmar relativizando-se; ...
Num ensaio de 1901, escrito aos 40 anos e intitulado A velhice e a eternidade, Lou afirmava: "O velho está liberto de todos os seus limites pessoais e escrúpulos mesquinhos. Retirado lentamente da vizinhança imediata dos outros seres vivos, ele se vê, progressivamente, reintroduzido no grande encadeamento universal".
É preciso amar a vida em todas as suas fases e amar até mesmo a morte. Aqui Eros e Thanatos se dão as mãos - são forças complementares e não contrárias. A morte é a redenção da vida individual, escreve Lou num artigo sobre o misticismo russo. Nossa morte não nos separa dos seres que amamos; ela nos entrega de modo mais completo a eles:
No dia em que eu estiver no meu leito de morte
Faísca que se apagou -,
Acaricia ainda uma vez meus cabelos
Com tua mão bem-amada
Antes que devolvam à terra
O que deve voltar à terra,
Pousa sobre minha boca que amaste
Ainda um beijo.
Mas não esqueças: no esquife estrangeiro
Eu só repouso em aparência
Porque em ti minha vida se refugiou
E agora sou toda tua [Hino à morte]
A morte desfaz, assim, a distância entre os amantes, que agora vivem um no outro, sem que o individualismo os separe. A morte não é uma partida, umas uma volta: um retorno do indivíduo àquela união primitiva com as cosias. Por isso não a devemos temer.
A grande biografia de Lou Salomé ainda não foi escrita. Mas, pelo que dela nos resta, fica uma lição final de amor pela vida, de paixão pela vida, de totalização da vida. Por isso Lou desejou ser cremada e que suas cinzas fossem jogadas no jardim de sua casa, em Gottingen: para que seu corpo pudesse se incorporar à terra e ser transformado em planta e flor.
<http://www.cefetsp.br/edu/eso/filosofia/paixaolouandreassalome.html em 06/09/2008>
FÊNIX
Assassinei, menti, iludi – a mim mesma, ele nunca recriminou. Sorriu e me fez sorrir, seu nobre jeito de amar.
Por me permitir voar e ser livre, ele me teve furtivamente em suas mãos. Com isso pôde me prender... Quem sabe?
Ainda estou aqui. Sempre estarei. Sou a chama que renasce das cinzas que faço da minha própria vida.