terça-feira, 1 de abril de 2008

Amarelina

Amarelina era uma menina muito recatada. Vivia num bairro comum na zona leste de sua cidade. Estudava perto de casa e tinha muitos amigos. Ela brincava com seus amigos, mas sem muito alvoroço, com poucos risos e nenhuma gargalhada.
Os anos passaram e Amarelina concluiu seus estudos fundamental e médio. Então logo saiu em busca de um emprego para que contribuísse nas despesas de casa. Sua mãe era doméstica e seu pai era motorista de ônibus. Os rendimentos dos dois juntos permitiam apenas que sua família não passasse fome.
Ela conseguiu um emprego de atendente numa lanchonete no centro da cidade. Ali via muita gente. Pessoas apressadas passavam de um lado para o outro. Algumas paravam para tomar o café-da-manhã ou fazer algum lanche. Nenhuma deixava-lhe qualquer gorjeta. Isso a entristecia.
Havia outra coisa que há muito tempo realmente incomodava Amarelina. Era seu nome. Seus pais nunca souberam explicar o porque deste nome. Ela chegava a se enxergar amarela no espelho, embora tivesse a tez morena. E isso lhe trazia inquietação, pois amarelo era a cor sem cor, sem graça, sem sal, sem vida. Mas isso pensava de vez em quando, principalmente nos momentos em que a lanchonete estava vazia e ela se punha a varrer a frente do estabelecimento.
Num dia quente de sol radiante, ouviu uma conversa no balcão da lanchonete que chamou sua atenção. Duas pessoas falavam sobre como mudar o nome de batismo, ou seja, o do registro de nascimento. Era um trâmite jurídico, mas viável. Amarelina ouvia tudo, discreta e atenta. Desde aí passou a imaginar um novo nome para si. Algo mais vivo e mais interessante, que pudesse conferir mais vida e cor a sua pacata vida. E pôs-se a pensar a respeito.
Depois de uma semana teve um sonho. Sonhou que estava numa boate dançando com um vestido amarelo radiante e dançava com sapatos de salto. As pessoas se deslumbravam com sua leveza e brilho. Um belo rapaz chegou até ela com um sorriso e convidou-a para dançar. Ela aceitou e a música se tornou lenta e romântica. Ao final da dança o rapaz perguntou o nome dela, e ela respondeu: Raio de Luz.
Quando acordou o sol a incomodava pela janela do quarto. Ao olhar as horas viu que estava atrasada. Mas não se preocupou. Estava ainda sonolenta e prazerosa pelo sonho que acabara de ter. Não pensava no rapaz, e sim no seu novo nome. Que era um sinônimo para o nome atual dela, uma outra face do nome, uma nova face de si. Raio de Luz abriu um radiante sorriso e pulou da cama.
Ao chegar ao trabalho, foi chamada para falar com o gerente da lanchonete. Ao entrar na sala sorriu maliciosamente, como quem tinha um segredo e não iria revelar, mas permitiria que fosse descoberto, e disse bom dia. A malícia do sorriso não impediu que ela recebesse uma chamada. Entretanto, isso em nada abalou seus ânimos. Era outra pessoa, uma nova mulher.
Ao passar pela rua era como se a vida toda até aquele momento tivesse visto as coisas em preto-e-branco e somente agora enxergava as cores do céu, do sol, das pessoas. Era tudo muito lindo e estimulante que dava a ela um prazer incomensurável. Raio de luz experimentava pela primeira vez na sua vida o sabor e a cor da felicidade.

28/03/08

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