segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Carta a Don Juan

Saudações, meu caro amigo Don Juan.

Não sei os pormenores de sua vida, devido a sua postura reservada. Tampouco tenho conhecimento de seus negócios e empreendimentos durante o tempo em que esteve por aqui. Tenho conhecimento que é um exímio jogador de cartas e um amante das bebidas fortes, algo que temos em comum.
No entanto, percebo que passou despercebida aos meus olhos a mais significativa de suas habilidades: amar mulheres. Estou cometendo algum juízo equivocado? Diga-me, amigo, se for este o caso. Senão, prossigo.

Antes de sua saída não tinha notado essa aptidão sua. Agora percebo e sinto isso, já que há uma nostalgia no ar de Vila Santa Verônica desde sua partida.
As mulheres, nossas mulheres, já não são as mesmas. Seus olhares não são os mesmos desde que a nau Guilhermina se pôs em alto-mar levando-te Atlântico além. Vivem lânguidas e inexpressivas. As vestimentas das jovens não estão mais coloridas. Nem brilham mais seus lábios. Seus cabelos ficam desaprumados à revelia do vento durante todo o dia. As senhoras, elas já não cantam à beira do rio enquanto labutam suas tarefas domésticas. Por isso não encantam sequer os vendedores vindos dos mais pobres vilarejos. Seus semblantes estão curtidos. Envelheceram cinco anos em um mês, desde sua partida.

Particularmente, confesso, adoraria consolá-las. Abriria mão de minha fidelidade estrita a minha amada Carolina das Flores. Contudo, amigo meu, não me dão oportunidade de aproximação seque. Não dão oportunidade a ninguém. Já não têm olhos para homem algum. Não se sentem lisonjeadas com galanteios e cortejos de mais nobres partidos da redondeza. As senhoritas, ao que me parece, estão fadadas ao convento, e as senhoras ao divórcio.

Caríssimo, não desejo parecer-te impertinente, sabe que não gozávamos de muito estreita amizade. Mas, em nome da admiração que já nutria por ti e tu bem o sabes que agora ainda mais, diga-me o que fizestes a estas mulheres? O que tu tens? O que dizias e fazias a elas? Que acontecimentos se passaram embaixo de meus olhos sem que os pudesse ver?

Nas tabernas próximas ao cais não se comenta outro assunto. Todos os homens estão em polvorosos, preocupados, alguns mesmo zangados... Ninguém oferece resposta para tal mistério. Eu, o mais audacioso de todos, resolvi procurar-te para esclarecer contigo os acontecimentos que envolvem as mulheres e você, meu amigo, neste vilarejo.

Saúdo-te,
Luiz Antônio das Couves.

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